10 de julho de 2009

O que faz o filósofo?

Magistério é o destino da maioria dos formados em Filosofia. Outros tantos encontram no curso o complemento para uma visão crítica da carreira profissional escolhida noutra graduação

Luar Maria Brandão
Especial para O POVO
04 Jul 2009 - 15h38min


Nem só de tecnologias vive a sociedade moderna. O cotidiano do mundo permeado por complexos problemas e discussões sociais faz imprescindível o trabalho de profissionais da área de humanas. Nesse contexto, a atuação crítica e radical do filósofo dentro da totalidade do conhecimento é cada vez mais necessária, mas enfrenta certos preconceitos dentro do mercado de trabalho. Ser filósofo é uma missão ou pode ser definido como ofício?

Segundo o coordenador do curso de Filosofia da Universidade Federal do Ceará (UFC), professor José Carlos de Almeida, esse dilema surgiu ainda na Grécia Antiga, quando Sócrates (479-399 a.C) inaugurou a Filosofia Clássica e os pensamentos metafísicos na busca do fundamento último das coisas. Mas hoje esse é de fato um exercício profissional regulamentado, "ainda que existam dúvidas na mente das pessoas", afirma o professor.

Enquanto profissional formado exclusivamente em Filosofia, há duas opções de carreira: a da licenciatura e a do bacharelado. Como licenciado, ele poderá ensinar Filosofia nas escolas de Ensino Médio e, com Mestrado e Doutorado, seguir o magistério nas universidades - que geralmente oferecem melhor remuneração. Já quem é habilitado bacharel trabalha como pesquisador, dando continuidade à pesquisa iniciada na pós-graduação.

Para além das duas habilitações, o exercício filosófico pode se dar em outras áreas da sociedade, uma vez que a Filosofia é a atuação da crítica rigorosa em diversos âmbitos do conhecimento. "Existe a Filosofia da Arte, da Literatura, do Direito, da Física, das Ciências Biológicas. Isso porque ela (a Filosofia) se debruça sobre a totalidade das coisas e inclui as diversas áreas do mercado de trabalho", explica José Carlos.


FILOSOFIA PARA NÃO-FILÓSOFOS

Profissionais já formados encontram nesse curso o complemento crítico para a carreira

De acordo com a professora de Filosofia da Universidade Estadual do Ceará, Eliana Paiva, a maioria dos alunos formados nessa graduação ou entra no mercado de trabalho contribuindo filosoficamente na licenciatura ou vai para a universidade atuar como pesquisador. Existe uma outra classe de alunos, no entanto, que estuda Filosofia para complementar a carreira profissional escolhida na Medicina, na Engenharia, no Direito e nas Ciências Sociais, para citar alguns exemplos.

"Esses profissionais formados em Filosofia já veem a segunda profissão de uma maneira enriquecida. São pessoas mais críticas: é um literato mais criativo, um político mais engajado, um paisagista mais livre. Ou seja, pessoas que não se contentam com uma só versão. A Filosofia viabiliza uma visão mais complexa de mundo", afirma a professora Eliana. Para ela, a formação em Filosofia dá direito a um encontro com novas potencialidades e indignações.

A estudante Anne Aguiar, 24, terminou no ano passado a graduação em Filosofia na UECE e já engatou no curso de Direito. "Amo a advocacia. Trabalharia sem problemas com a Filosofia, mas dentre as paixões prevalece o Direito", diz a estudante. Anne explica que decidiu cursar Filosofia porque era um "investimento necessário" para ser advogada. "A Filosofia nos faz refletir, absorver e refratar o pensar. Nos demais cursos, as perguntas chaves para a graduação geralmente definem-se em "o que é..". A Filosofia é magnífica, porque aduz o "por que".

O professor José Carlos de Almeida, coordenador do curso de Filosofia da UFC, também acredita na importância da interlocução da Filosofia com outras áreas do conhecimento, uma vez que ela ajuda a pensar os princípios e as causas únicas das ciências. "A filosofia é a mãe da ciência, mas os filhos estão esquecendo dela, principalmente porque o que pesa é a questão econômica. Muitos se perguntam como viver de Filosofia", afirma.

Outros caminhos
Mas, segundo ele, o filósofo pode atuar junto à Política e até no setor de recursos humanos de empresas. A professora Eliana Paiva chama atenção para essa "ambivalência do filósofo", que por se inquietar diante dos questionamentos próprios e dos outros, pode participar da sociedade a partir do engajamento político, através das mídias, das críticas nos jornais. Ela lamenta, no entanto, a resistência dos veículos de comunicação.

Para exemplificar, a professora cita a questão da violência. O filósofo é capaz de debatê-la, transformar eventos já tão banalizados em questionamentos, para que a população perceba o que está por trás dos problemas da sociedade e não a reduza à suas causas. "Filósofos questionam, mostram o cerne da questão, enquanto sociólogos e psicólogos sugerem soluções. Agora, é preciso uma guinada na importância desprendida ao filósofo. Deve-se abrir caminhos para que o filósofo intervenha na sociedade", afirma.

Colaboração: Rodney Eloy

Fonte: Opovo

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