30 de setembro de 2008

Redução Fenomenológica da Consciência e Decisão Antecipadora

O segundo capítulo da segunda seção de Ser e Tempo é o momento em que a analítica mais se afasta da fenomenologia transcendental husserliana e, novamente, da subjetividade típica da modernidade. No Husserl das Idéias para uma Fenomenologia Pura e para uma Filosofia Fenomenológica, a região da consciência pura intencional é o resíduo insuperável da redução eidética (e fenomenológica) dos entes no mundo. Em Heidegger, a consciência [Gewissen] é, ela mesma, reduzida fenomenologicamente:

A redução heideggeriana atinge o Eu transcendental, como unidade monádica que existiria em contínua evidência para si mesmo, no qual Husserl, que bem próximo ficou de Kant, e mais ainda de Descartes, reinvestiu, tomando por modelo o Cogito cartesiano, o sujeito transcendental da filosofia moderna. Colocando entre parênteses o Eu assim concebido, a epoché de Heidegger suspende a certeza do Cogito em que se baseou a Fenomenologia enquanto ciência filosófica rigorosa .

A analítica existencial de Heidegger vê a consciência como um dos principais existenciais do Dasein . A consciência reduz-se ao "aí" da, à abertura, ao ser-em do Dasein. Ontologicamente falando, a consciência é caracterizada como o apelo (ou clamor, Rufen] silencioso que con-clama Dasein a assumir-se, a escolher a si mesmo, a retirar-se do das Man no qual está desde sempre existindo inautenticamente: "A passagem do impessoal, ou seja, a modificação existenciária do próprio-impessoal para o ser-si-mesmo em sentido próprio deve-se cumprir como recuperação de uma escolha. Recuperar a escolha significa escolher essa escolha, decidir-se por um poder-ser a partir de seu próprio si-mesmo " . Essa escolha de si mesmo é "querer-ter-consciência" - é o que Heidegger chama de "decisão antecipadora" ou "decisão resoluta" [Entschlossenheit ]. A decisão resoluta é a abertura privilegiada que projeta Dasein para sua existência autêntica, fazendo com que ele assuma suas possibilidades mais próprias. É a análise do ek-sistir autêntico que expõe Dasein como poder-ser todo autêntico. Dasein resoluto [entschlossenes Dasein] projeta-se de modo autêntico em sua própria morte, ao assumir-se como "moribundo", como "ser-para-o-fim", empenhado no nada que é a essência do Cuidado.

Não podemos nos esquecer que Dasein resoluto não está destacado do mundo, ele é sempre ser-no-mundo. A diferença para a abertura decadente do cotidiano impessoal é que Dasein resoluto torna-se transparente a si mesmo, no horizonte de sua morte iminente. Dasein resoluto permanece na con-vivência com os outros e no lidar com os entes intramundanos, mas não mais se encontra perdido em meio a todos eles: "Dasein resoluto pode tornar-se "consciência" dos outros. A partir do ser-si-próprio mais autêntico da decisão, surge o ser-com-os-outros autêntico - ele não surge dos compromissos ambíguos e invejosos das alianças verborrágicas típicas do impessoal, nem de qualquer empreendimento que se queira realizar na impessoalidade " [nossa tradução]. Assim, o ser-para-a-morte é o sentido ontológico do ser-todo do Dasein em sentido próprio, isto é, autêntico. Em Heidegger, a morte é o princípio de individuação para o Dasein.



Colaboração: Prof. Drndo. Newton Pereira

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