4 de junho de 2009

Por que Karl Marx adoraria os EUA



O contraste entre a Europa e os Estados Unidos voltou ao debate, à medida que conservadores chocados olham para o socorro do governo ao sistema financeiro e avisam que o "socialismo ao estilo europeu" está chegando ao Novo Mundo. Por trás dessa reação está a suposição básica de que a Europa é um gigantesco Estado de bem-estar social e os Estados Unidos, a terra da oportunidade no mercado livre, onde realizações atraem recompensas e fracassos são rapidamente descartados. Vamos mais devagar. Os americanos já se sentem muito confortáveis com o socialismo. Basta olhar para os esportes profissionais.

Os esportes tanto refletem quanto encarnam uma cultura. É impossível, por exemplo, entender a Itália e sua política sem saber o bastante sobre futebol e a relação entre o jogo e Silvio Berlusconi – o primeiro-ministro e ex-proprietário do AC Milan, que transformou o grito da torcida italiana (Fuerza Italia) no nome de seu partido político. Assim, se olhássemos para as ligas esportivas americanas veríamos um análogo da filosofia americana de livre mercado – uma espécie de darwinismo no campo. Em vez disso, encontramos, se não o paraíso dos operários, ao menos uma rede de segurança de cuja malha é impossível sair.

Quando se trata de esporte, são os europeus os verdadeiros meritocratas – que recompensam o sucesso deixando o fracasso para trás e permitindo a cada homem lutar por si. Em comparação, os esportes profissionais americanos são organizados como um gigantesco Estado de bem-estar social onde a riqueza é distribuída, gastos com luxo são taxados e repassados aos pobres e não se permite ao mais fraco nem mesmo fracassar.

O contraste é mais impressionante ainda no futebol americano. Para os estrangeiros a Liga Nacional de Futebol (NFL) é os Estados Unidos. E a NFL é um exemplo vivo de divisão igualitária. As regras de divisão dos rendimentos da liga fazem com que a enorme renda de TV vá para uma caixinha que é distribuída igualmente, independentemente de sucesso. Assim, os times grandes e bem-sucedidos subsidiam os menores. Há também tetos salariais e mecanismos de escolha de jogadores que melhoram os pobres em detrimento dos ricos. Tudo em nome da igualdade. No basquete a NBA tem um teto salarial e um sistema de escolha de jogadores similar ao do futebol americano. Em comparação, como observou o especialista inglês em futebol Gabriele Marcotti, é no velho jogo inventado na Inglaterra, o da bola de couro e 11 de cada lado, que funciona a saudável teoria de cada time por si.

O futebol europeu é um esporte multibilionário e seus clubes são símbolos de identidade nacional e regional. E o meio no qual operam é virtualmente o livre mercado. Com pouco controle central dos organismos que governam o esporte, proprietários são livres para gastar e contratar jogadores como quiserem. São os ricos que prosperam – no avesso do que ocorre nos Estados Unidos, onde um time perdedor, como o Boston Celtics, pode navegar de lugar nenhum direto ao topo – foi o campeão da temporada passada, mas desde 1986 não ganhava nada.

Os americanos podem ter se surpreendido com empresas que foram salvas por um governo intervencionista, mas nossos esportes são estruturados assim. Já as ligas de futebol européias funcionam em torno do que se poderia chamar de "conceito americano" de promoção. Se um time trabalha duro na temporada européia de futebol e ganha jogos suficientes, pode ser promovido para uma liga melhor, onde os salários são mais altos. Se fracassar, desce. Os europeus instituíram a sobrevivência do mais forte enquanto as ligas esportivas americanas incorporam algo que Karl Marx com certeza teria preferido.

Steven Stark,
The Boston Globe

Fonte: Revista da semana

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