27 de setembro de 2008

LHC - por Marcelo Gleiser

Marcelo Gleiser, o cientista e divulgador de ciência brasileiro, conhecido por sua coluna Micro/Macro do Caderno Mais da Folha de São Paulo, publicou neste último dia 20 de julho, na já referida coluna, um texto sobre o LHC e o medo gerado pelo trabalho de desinformação de alguns meios de comunicação.

Como disse aqui no Filosofando a alguns meses, uma considerável massa tem acalentado esperanças de que o LHC venha a ser a “máquina do fim do mundo”, esse tipo de euforia escatológica é muito comum e sempre se manifesta quando a Ciência se propõe a ampliar sua área de investigação.

Leiam com atenção do texto de Marcelo a seguir, creio que ele é suficientemente elucidativo para dissipar o medo e ajudar a entender melhor a importância do LHC para a Ciência.

Medo dos físicos

O mundo não vai acabar por causa dos miniburacos negros do LHC

Ainda neste ano deve entrar em funcionamento a maior máquina já criada pelos homens (e mulheres), o Grande Colisor de Hádrons, ou LHC. O projeto, com custo estimado em US$ 8 bilhões, envolveu milhares de físicos, engenheiros e técnicos. Seu objetivo principal é explorar uma das questões mais fundamentais da ciência, a origem da massa.

Segundo a física moderna, a matéria é composta por pequenos corpúsculos indivisíveis, as partículas elementares. Os colisores de partículas são máquinas que aceleram esses corpúsculos uns contra os outros ao longo de circuitos semelhantes à pistas ovais de corrida, ocasionalmente provocando colisões frontais entre eles.

O segredo dos colisores está na violência das colisões: as partículas são aceleradas até velocidades próximas à da luz; ao colidirem, sua energia de movimento (ou energia cinética) é transformada -segundo a famosa relação E=mc2- em outros corpúsculos. Com isso, físicos podem estudar a composição da matéria e as diferenças entre as massas das partículas.

Mas o assunto hoje não é a física detalhada do LHC, e sim o medo que a máquina tem gerado. Quando o Centro Europeu de Física Nuclear, o Cern, a casa do LHC, anunciou que dentre as possíveis descobertas está a produção de miniburacos negros, o público logo se interessou. “Opa! Buracos negros sugam tudo, certo? Será que esses físicos loucos vão criar um monstro que vai sugar a Terra inteira, criando o próprio Apocalipse?”

Rapidamente, a notícia motivou inúmeros artigos e discussões em blogs. Um morador do Havaí chegou até a entrar na justiça com uma ação para tentar deter o LHC, alegando que físicos inconseqüentes poderiam destruir o mundo.

O temor é completamente infundado. É verdade que o LHC atingirá energias maiores do que no interior do Sol. Mas a diferença essencial é de escala. Quando prótons (os corpúsculos que irão colidir no LHC) colidem, a energia liberada é equivalente a de um bando de mosquitos. O que o LHC fará magnificamente é concentrar essa energia numa escala submicroscópica. Como afirma o relatório divulgado pelos especialistas de segurança do CERN, quando você bate palmas para esmagar um mosquito, está criando uma colisão com energia muito maior do que a do LHC. E ninguém cria mini buracos negros batendo palmas.

(Aliás, uma imagem bem propícia a um conto de ficção científica…)

Em princípio, é possível que a colisão de prótons crie um miniburaco negro. Mas esse buraco negro não tem nada a ver com algo que pode se tornar um gigante, tragando a massa terrestre e nós com ela. Miniburacos negros têm massa microscópica e vivem por muito pouco tempo. Como propôs Stephen Hawking, esses objetos perdem massa -evaporam- muito mais rapidamente do que são capazes de ganhá-la. Isso porque sua massa é pequena demais para exercer atração eficiente sobre outros objetos. Portanto, mini buracos negros -se criados no LHC, uma possibilidade no mínimo muito remota- irão desaparecer rapidamente, sem criar qualquer efeito detectável macroscopicamente.

Por trás do pânico está o medo do desconhecido, de estarmos nos debruçando sobre uma janela que dá para terras nunca dantes vislumbradas.

Juntando a isso o fato de físicos serem mesmo capazes de destruir o mundo -haja visto as bombas de hidrogênio- e mais as tantas histórias e filmes de ficção científica sobre o cientista louco cuja invenção foge do controle (iniciado com Frankenstein), fica clara a origem do temor. Mas o leitor pode ficar tranqüilo, pois nada de apocalíptico vai ocorrer. A menos, claro, que a máquina não funcione.

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